UNEMAT - Universidade do Estado de Mato Grosso Hospital Santo Antônio

📊 Estatística - AULA 01

Descrição de Variáveis e Medidas-Resumo

Residência Hospital Santo Antônio

Curso de Extensão em Estatística Básica

Agosto de 2025

📋Apresentação

Este conteúdo foi desenvolvido como material didático para um curso de extensão em estatística, com foco na aplicação prática para a pesquisa e a clínica médica. Nosso objetivo é capacitar profissionais da saúde a interpretar e aplicar conceitos estatísticos de forma crítica e eficaz em seu dia a dia.

Por que estudar Estatística Médica?

A estatística médica é a espinha dorsal da medicina baseada em evidências. Dominar seus princípios permite que você:

🎯 Objetivos de aprendizagem:

🗂️Estrutura do conteúdo a

  1. Descrição de Variáveis
    • Definição de variável e dado
    • Natureza das variáveis (quantitativas e qualitativas)
    • Classificações especiais
  2. Medidas-Resumo
    • Medidas de tendência central (média, mediana, moda)
    • Medidas de dispersão (desvio-padrão, variância)
    • Medidas de posição (quartis, percentis)

💡 Metodologia: Cada conceito será apresentado com exemplos práticos da área médica para facilitar a compreensão e aplicação no dia a dia clínico. Os infográficos e elementos visuais foram criados especificamente para tornar o aprendizado mais didático e envolvente.

1. Descrição de Variáveis

Fundamentos para compreender e classificar as características que estudamos em medicina

🔬1.1 Definição de Variável

Para iniciar sua jornada na estatística, é crucial entender a distinção entre dado e variável. Embora frequentemente usados de forma intercambiável no senso comum, em estatística eles possuem significados precisos.

Variável: É uma propriedade ou característica que pode ser observada e que varia entre os indivíduos ou elementos de uma população ou amostra.

Dado: É o valor específico que uma variável assume para um determinado indivíduo ou observação.

Infográfico Dado vs. Variável em Medicina
A diferença fundamental entre dado e variável no contexto da saúde.

Como o próprio nome sugere...

Uma variável é tudo aquilo que varia! Portanto, é toda característica para a qual podemos atribuir valores, ou melhor, um espectro de valores, que também são conhecidos como dados.

Exemplo: Pressão Arterial Sistólica

Considere a pressão arterial sistólica de pacientes em uma clínica:

  • Variável: "Pressão arterial sistólica"
  • Dados: 120 mmHg, 135 mmHg, 118 mmHg

A pressão varia de um paciente para outro, por isso é uma variável.

Outros Exemplos Médicos:

  • Idade: pode variar de 0 a 100+ anos
  • Tipo sanguíneo: pode ser A, B, AB ou O
  • Grau de dor: pode variar de 0 a 10 na escala visual
  • Número de internações: pode ser 0, 1, 2, 3... por ano

Importante: As variáveis não estão presentes apenas nos seres humanos. Toda característica que tem a capacidade de variar entre elementos de um mesmo conjunto pode ser considerada uma variável. Por exemplo, em um estudo sobre hospitais, o "número de leitos" seria uma variável.

🔍1.2 Natureza das Variáveis

As variáveis são classificadas em duas naturezas fundamentais: quantitativas e qualitativas, que determinam os tipos de análises estatísticas que podem ser realizadas.

Infográfico Classificação de Variáveis em Medicina
Diagrama de fluxo para classificar variáveis em estudos de saúde.

Variáveis Quantitativas (Numéricas)

São aquelas que podem ser mensuradas ou quantificadas por meio de números. Elas representam quantidades e podem ser subcategorizadas em contínuas e discretas.

Contínuas

Admitem valores decimais e formam um intervalo contínuo de valores. Geralmente resultam de medições.

Exemplos médicos:
  • Peso: 65,5 kg; 78,2 kg; 90,15 kg
  • Altura: 1,75 m; 1,68 m; 1,82 m
  • Glicemia: 95,5 mg/dL; 110,3 mg/dL
  • Tempo de internação: 3,5 dias; 10,2 horas

Discretas

Não admitem "casas decimais", limitando-se a números inteiros. Geralmente resultam de contagens.

Exemplos médicos:
  • Número de filhos: 0, 1, 2, 3... (não existe 1,5 filho)
  • Doses de vacina: 1, 2, 3... (uma pessoa tomou 2 doses, não 2,7)
  • Número de consultas: 1, 2, 3... por ano
  • Número de leitos ocupados: 50, 75, 100...

Variáveis Qualitativas (Categóricas)

São aquelas às quais não podemos atribuir valores numéricos que representem uma quantidade, mas que expressam uma qualidade, atributo ou característica.

Nominais

Nomeamos a característica, sem que haja uma ordem ou hierarquia natural entre as categorias.

Exemplos médicos:
  • Tipo sanguíneo: A, B, AB, O (não há ordem)
  • Sexo/Gênero: Masculino, Feminino
  • Cor dos olhos: Azul, Verde, Castanho
  • Presença de doença: Sim, Não

Ordinais

As categorias apresentam uma ordem ou hierarquia entre si, mas a diferença entre as categorias não é necessariamente uniforme.

Exemplos médicos:
  • Grau de queimadura: 1°, 2°, 3° (há ordem de gravidade)
  • Estadiamento do câncer: I, II, III, IV (progressão)
  • Grau de dor: Leve, Moderada, Intensa
  • Classificação NYHA: Classe I, II, III, IV

Atenção: A classificação de uma variável pode depender de como ela é coletada ou utilizada no estudo. Por exemplo, a idade pode ser tratada como contínua (25,5 anos) ou como ordinal (faixas etárias: 0-10 anos, 11-20 anos, etc.).

🔄Algoritmo para Classificar Variáveis

Para auxiliar na classificação correta de qualquer variável em sua prática ou pesquisa, siga este algoritmo simples:

A variável pode ser quantificada (medida numericamente)?

  • SIM → É uma Variável Quantitativa (Numérica). Prossiga para o Passo 2A.
  • NÃO → É uma Variável Qualitativa (Categórica). Prossiga para o Passo 2B.

Se for Quantitativa: Pode ser fracionada (aceita valores decimais)?

  • SIM → É uma Variável Contínua.
  • NÃO → É uma Variável Discreta.

Se for Qualitativa: Existe ordem ou hierarquia entre as categorias?

  • SIM → É uma Variável Ordinal.
  • NÃO → É uma Variável Nominal.

Exemplo: Glicemia (mg/dL)

1. Pode ser quantificada? SIM (ex: 95 mg/dL, 110 mg/dL)

2. Pode ser fracionada? SIM (ex: 95,5 mg/dL, 110,3 mg/dL)

Resultado: Variável Quantitativa Contínua.

Exemplo: Tipo Sanguíneo

1. Pode ser quantificado? NÃO (ex: A, B, AB, O)

2. Existe ordem? NÃO (não há hierarquia entre os tipos)

Resultado: Variável Qualitativa Nominal.

Dica Clínica: Em questões de prova ou na interpretação de estudos, se a descrição da variável sugere uma progressão, gravidade, ou classificação em estágios (como estadiamento de doença, grau de dor, ou classificação funcional), é muito provável que seja uma variável ordinal.

📊Variáveis Comuns em Medicina

Abaixo, uma tabela com variáveis frequentemente encontradas na prática médica e suas classificações:

Variável Natureza Exemplo de Valores Aplicação Clínica
Idade Contínua 25,5 anos; 67,2 anos Estratificação de risco, dosagem medicamentosa
Peso Contínua 65,5 kg; 78,2 kg Cálculo de IMC, dosagem de medicamentos
Pressão arterial Contínua 120,5/80,2 mmHg Diagnóstico de hipertensão, ajuste terapêutico
Número de filhos Discreta 0, 1, 2, 3... História obstétrica, planejamento familiar
Doses de vacina Discreta 1, 2, 3... Controle de imunização, esquemas vacinais
Sexo/Gênero Nominal Masculino, Feminino Estratificação epidemiológica, medicina personalizada
Tipo sanguíneo Nominal A, B, AB, O Transfusões, transplantes, genética
Grau de queimadura Ordinal 1°, 2°, 3° Prognóstico, protocolo de tratamento
Estadiamento do câncer Ordinal I, II, III, IV Prognóstico, escolha terapêutica
Grau de dor Ordinal Leve, Moderada, Intensa Manejo da dor, escolha de analgésicos

Importante: A classificação pode variar dependendo de como a variável é coletada e tratada no estudo. Sempre observe as informações fornecidas no contexto da questão ou pesquisa.

2. Medidas-Resumo

Ferramentas estatísticas essenciais para sintetizar e descrever as principais características de um conjunto de dados

📈2.1 Medidas de Tendência Central

As medidas de tendência central indicam o valor em torno do qual os dados se agrupam. As mais comuns são a média, a mediana e a moda.

Infográfico Medidas de Tendência Central em Medicina
Visão geral das principais medidas de tendência central e seus usos em dados médicos.

Média Aritmética

A média é a soma de todos os valores dividida pelo número total de observações. É a medida mais utilizada para variáveis quantitativas contínuas com distribuição simétrica.

Média (X̄) = ΣX / n Onde: ΣX = soma de todos os valores n = número de observações

Exemplo Clínico

Idades de 5 pacientes: 30, 34, 37, 41, 49 anos.

Média = (30 + 34 + 37 + 41 + 49) / 5 = 191 / 5 = 38,2 anos

Vantagens: Utiliza todos os dados, familiar e fácil de calcular.

Desvantagens: Muito sensível a valores extremos (outliers).

Mediana

A mediana é o valor central quando os dados estão ordenados. Ela divide o conjunto em duas metades, com 50% das observações abaixo e 50% acima.

Exemplo Clínico (n ímpar)

Idades dos 5 pacientes ordenadas: 30, 34, 37, 41, 49.

A mediana é 37 anos.

Exemplo Clínico (n par)

Tempo de resposta (min): 10, 12, 15, 18, 20, 25.

Valores centrais: 15 e 18.

Mediana = (15 + 18) / 2 = 16,5 minutos.

Vantagens: Não é afetada por outliers, robusta para distribuições assimétricas.

Desvantagens: Não utiliza todos os dados no cálculo.

Moda

A moda é o valor que aparece com maior frequência. É a única medida que pode ser usada para variáveis qualitativas nominais.

Exemplo Clínico

Tipos sanguíneos: A, B, O, A, AB, O, A, A, B, O.

Frequência: A (4), B (2), AB (1), O (3).

A moda é o tipo A.

📊2.2 Medidas de Dispersão

As medidas de dispersão indicam o quão espalhados ou variados os dados estão em relação à medida de tendência central. Elas complementam as medidas de tendência central, fornecendo uma imagem mais completa da distribuição dos dados.

Infográfico Medidas de Dispersão em Medicina
Principais medidas de dispersão e sua relevância na análise de dados clínicos.

Amplitude (Range)

A amplitude é a diferença entre o maior e o menor valor. É a medida de dispersão mais simples.

Amplitude = Valor Máximo - Valor Mínimo

Exemplo Clínico

Idades: 30, 34, 37, 41, 49 anos.

Amplitude = 49 - 30 = 19 anos.

Variância

A variância mede a dispersão média dos dados em torno da média. É calculada como a média dos quadrados das diferenças entre cada valor e a média.

Variância (s²) = Σ(X - X̄)² / (n - 1)

Exemplo Clínico

Usando as idades: 30, 34, 37, 41, 49. Média = 38,2.

Diferenças: -8,2, -4,2, -1,2, 2,8, 10,8

Quadrados: 67,24, 17,64, 1,44, 7,84, 116,64

Variância = 210,8 / 4 = 52,7

Desvio-Padrão

O desvio-padrão é a raiz quadrada da variância. Expressa a dispersão na mesma unidade da variável original, sendo mais fácil de interpretar.

Desvio-Padrão (s) = √Variância

Exemplo Clínico

Usando a variância calculada (52,7):

Desvio-Padrão = √52,7 ≈ 7,26 anos

Isso significa que, em média, as idades se desviam em 7,26 anos da média de 38,2 anos.

Coeficiente de Variação (CV)

O coeficiente de variação é uma medida de dispersão relativa, expressa como porcentagem. Útil para comparar variabilidade entre diferentes variáveis.

CV = (Desvio-Padrão / Média) × 100%

Exemplo Clínico

Comparar variabilidade:

  • Glicemia: média 100 mg/dL, DP 10 mg/dL → CV = 10%
  • Peso: média 70 kg, DP 7 kg → CV = 10%

Ambos têm a mesma variabilidade relativa.

Aplicação Clínica: As medidas de dispersão são fundamentais para avaliar a precisão de exames laboratoriais, a variabilidade de respostas a tratamentos, e para estabelecer valores de referência em medicina.

📏2.3 Medidas de Posição (Quartis e Percentis)

As medidas de posição dividem um conjunto de dados ordenado em partes iguais, indicando a posição relativa de um valor dentro da distribuição. São particularmente úteis para descrever distribuições não simétricas e para identificar valores de corte.

Quartis

Os quartis dividem um conjunto de dados ordenado em quatro partes iguais:

  • Q1 (Primeiro Quartil): Divide os 25% inferiores dos 75% superiores
  • Q2 (Segundo Quartil): É a mediana (50%)
  • Q3 (Terceiro Quartil): Divide os 75% inferiores dos 25% superiores

Exemplo Clínico

Colesterol LDL (mg/dL) de 11 pacientes:

80, 85, 90, 92, 95, 100, 105, 110, 115, 120, 130

  • Q1: 90 mg/dL (25% abaixo)
  • Q2 (Mediana): 100 mg/dL (50% abaixo)
  • Q3: 115 mg/dL (75% abaixo)

Percentis

Os percentis dividem um conjunto de dados ordenado em 100 partes iguais. O P-ésimo percentil é o valor abaixo do qual P% das observações caem.

Exemplo: Curvas de Crescimento

Se um bebê está no 90º percentil de peso para a idade, significa que:

  • 90% dos bebês da mesma idade pesam menos
  • 10% dos bebês da mesma idade pesam mais

Uso em Medicina:

  • Curvas de crescimento: Avaliação nutricional de crianças
  • Valores de referência: Determinação de limites para exames (ex: 95º percentil para triglicerídeos)
  • Avaliação de risco: Identificação de pacientes em faixas específicas
  • Medicina preventiva: Estratificação de risco cardiovascular

💡 Dica Prática: Em medicina, os percentis são amplamente utilizados para interpretar exames laboratoriais e avaliar o crescimento e desenvolvimento. Familiarize-se com os valores de referência mais comuns em sua área de atuação.

🎯Conclusão

Nesta apostila, exploramos os conceitos fundamentais de descrição de variáveis e medidas-resumo, essenciais para qualquer profissional da saúde que lida com dados. Compreender a natureza das variáveis e como sumarizar informações de forma adequada é o primeiro passo para realizar análises estatísticas válidas e tomar decisões clínicas baseadas em evidências.

Pontos-Chave Aprendidos:

  • Diferença entre dados e variáveis: Fundamento para coleta e análise
  • Classificação de variáveis: Determina o tipo de análise estatística
  • Medidas de tendência central: Resumem o centro da distribuição
  • Medidas de dispersão: Quantificam a variabilidade dos dados
  • Medidas de posição: Localizam valores na distribuição

Aplicações na Prática Médica:

  • Interpretação de estudos: Compreender metodologia e resultados
  • Avaliação de exames: Interpretar valores de referência
  • Pesquisa clínica: Planejar e analisar estudos
  • Tomada de decisão: Basear condutas em evidências
  • Comunicação: Transmitir informações de forma clara

🔬 Próximos Passos: Continue praticando e aplicando esses conceitos em sua rotina para aprimorar sua capacidade de interpretar e gerar evidências científicas. A estatística não é apenas um conjunto de fórmulas, mas uma ferramenta poderosa para entender a variabilidade, identificar padrões e transformar dados brutos em conhecimento útil para a saúde.

Lembre-se: A medicina baseada em evidências depende da sua capacidade de compreender e aplicar conceitos estatísticos. Cada paciente é único, mas os padrões estatísticos nos ajudam a tomar as melhores decisões possíveis com base no conhecimento científico disponível.